Por: CHICO VELLOZO
05/12/2022
09:55:38
EU VOU A LUTA COM ESSA JUVENTUDE
A revoltante guerra do Vietnã, gerou uma contracultura que pregava a paz e o amor através do movimento hippie que repercutiu em escala mundial, promovendo um novo entendimento nas relações humanas. Sexo, drogas e muito rock in roll embalaram o sonho de liberdade de um grande número de jovens que buscavam alternativas para o combate a caretice e a violência que imperava naquela época. Totalmente engessada, a sociedade seguia padrões rígidos em que nada podia ferir a “moral e os bons costumes” vigentes. Em função de muitos protestos, foram operadas guinadas surpreendentes, mas, conforme a música Gerações, de Zé Rodrix: ” De vinte em vinte anos. Aparece no mundo uma nova geração. Mas de quarenta em quarenta. É que todas as coisas se repetem.”
Na realidade, a busca pelo equilíbrio é constante. A quebra de paradigmas é dinâmica e as oscilações periódicas resultam em novos entendimentos e releituras.
A moda é um ótimo exemplo disso. A indústria do vestuário dita tendências que
usualmente reproduzem uma estética que já foi o usual em tempos idos.
A geração que lutou pela revolução de costumes, buscou novos caminhos para o processo educacional dos filhos e passou a se deparar com problemas inusitados. A falta de limites tornou-se um problema e, em muita das vezes, os filhos passaram a verdadeiramente a educar os pais, apresentando um comportamento conservador e nada afeito a tanta “liberdade”. Enfim, o conflito de gerações sempre existiu.
A assustadora velocidade em que tudo aconteceu foi quebrando barreiras e o mundo tornou-se pequeno. O noticiário - em tempo real - criou um verdadeiro paradoxo: algumas pessoas passaram a saber mais sobre países distantes do que sobre o próprio bairro. A “aldeia global” foi, através da televisão, gerando comportamentos difusos. Para piorar, a mídia em geral contribuiu para um processo de “aculturação” em que - através de filmes e novelas, por exemplo
- as pessoas assumiram condutas distintas às das suas culturas e tradições,
chegando a perder a própria essência. A veiculação de músicas estrangeiras
pelas rádios – notadamente em língua inglesa – tornou patente a dominação
cultural. Os ritmos nacionais passaram a ser relegados a um plano inferior.
Realmente, muita coisa aconteceu! Resolvi tratar desse assunto porque tenho muito orgulho de ter sido parte integrante de um universo tão rico em transformações. O assunto é extremamente complexo e o processo no âmbito histórico, antropológico e sociológico se aprofunda em um interminável estudo das dinâmicas das relações. Enfim, é preciso entender de maneira mais profunda e imparcial a intensa sequência de fatos tão marcantes.
Sinto-me extremamente confuso diante de tudo que ainda estou vivendo. O surgimento da “nova ordem mundial” - a partir da queda do muro de Berlim - aplacou a temerosa “guerra fria” que envolvia estadunidenses e russos, e, por um instante, cheguei a ter esperança que a partir dessa nova ordem seria possível imaginar a possibilidade de um mundo em paz. Ledo engano, nenhuma
mudança foi capaz de frear as guerras e conflitos gerados pela incontrolável e incessante busca por dinheiro e poder.
No atual cenário, muita gente prefere viver um mundo paralelo. Por incrível que pareça, a tecnologia, que realmente veio para facilitar a vida das pessoas, nos fez deparar com uma situação no mínimo curiosa: ela aproxima distantes e afasta próximos. Os jovens parecem tentar encontrar os ideais de liberdade por intermédio das redes sociais. Aparentemente ainda lutam por um mundo melhor através de uma comunicação que ocorre através de um verdadeiro “dialeto” repleto de abreviações, emojis, emoticons, avatares...
A possibilidade ampla e irrestrita de uma vida paralela em um universo virtual tem sido extremamente sedutora. Ela causa mais encantamento, não impondo responsabilidades nem os inúmeros desafios da vida real. Infelizmente, quem lutou por um mundo melhor e sobreviveu a tantas ameaças em um período tão intenso da história da humanidade, se depara com uma juventude que aparentemente não tem tanto interesse em fazer valer o milagre da vida. Gostaria de ter a certeza de que, ao seu modo, os jovens buscam a construção de um significativo legado.
Existem tantas desigualdades e injustiças que precisam ser combatidas, que não acredito que a juventude esteja alheia a tudo isso. Como um legítimo veterano, observo o trem da história passando em minha frente e tenho mais coisas a fazer do que tempo para realizar. Sinto-me cada vez mais próximo do “ponto final” do percurso.
“Eu acredito é na rapaziada
Que segue em frente e segura o rojão
Eu ponho fé é na fé da moçada
Que não foge da fera e enfrenta o leão
Eu vou à luta com essa juventude
Que não corre da raia a troco de nada
Eu vou no bloco dessa mocidade
Que não tá na saudade e constrói
A manhã desejada.”
- Gonzaguinha