Por: CHICO VELLOZO
14/10/2024
16:15:56
GALDINÓPOLIS - ONDE UM POUCO DE MIM AINDA HABITA
Quando morava em Niterói, minhas várias idas a Nova Friburgo foram sempre marcantes, entretanto um lugar do município tornou-se inesquecível para mim. Homenageando Galdino do Valle, um antigo político friburguense que ficou famoso por instituir o Dia das Crianças, Galdinópolis mora verdadeiramente em meu coração.
A primeira vez que lá estive foi em 1979. Fui com uma
galera niteroiense e ficamos em uma casa alugada a beira de um regato. Nossa
moradia temporária tinha fogão a lenha e era muito acolhedora. Sem luz, sem
telefonia e distante da estrada, ficamos praticamente isolados. Essa imersão em
um novo ritmo de vida foi muito significativa pra mim!
No início estranhei a ausência dos confortos da cidade
grande, mas logo percebi que estava apaixonado por aquele impressionante lugar. Ficava observando o
jeito de falar da comunidade local que era dotado de um forte sotaque estrangeiro,
resquícios da influência suíço/alemã na região. Era tudo muito calmo, tranquilo
e aquela sensação de paz me fazia muito bem.
Durante o dia os banhos de rio em meio a natureza radiante
e à noite as idas ao bar da dona Sofia e as intermináveis jogatinas de “purinha”
preenchiam o tempo plenamente. Fiquei surpreso com a quantidade de vaga-lumes
que cortavam a escuridão, assim como com as pessoas que passavam em forte ritmo de
caminhada e que, para espantar os “perigos da noite”, cantavam muito alto.
Quando íamos ao rio, era certo dar uma paradinha para tomar
um café na casa da “dona” Marica que, juntamente com “seu” Karl, eram muito
hospitaleiros e atenciosos. Aquelas conversas junto ao fogão a lenha foram
extremante prazerosas. Lembranças inesquecíveis que guardo com muito carinho.
Conheci os filhos e netos do casal. Lastromiro, Arcolino e seus filhos Arcolei, Arcolai e Marciano. Agora, figuraça mesmo era seu Zezé! Tomava 2 porres por dia e ia “rebocado” para casa pelos cachorros. Quando me contavam isso eu duvidava, mas um dia presenciei a cena. Ele, tombado no mato pela manguaçada, fato recorrente, foi cercado pela cachorrada que ficava mordiscando o combalido Zezé até que ele ficasse de pé. Com ataques precisos os cães iam mordendo de maneira estratégica as pernas dele conduzindo-o para casa. Diziam que a mulher o abandonou por causa da bebida, mas na verdade ela realmente deu o ultimato: eu ou a cachaça? A resposta foi assertiva: prefiro o “mé”!
Já retornei várias vezes em diversas fazes da minha vida. Lembro de um carnaval que fui acampar na beira do rio e um amigo de Niterói, ciente do meu lado folião. vaticinou: “você vai se arrepender de não brincar o carnaval, vai sentar na beira do rio e chorar”. Ele errou feio, curti ir pra lá, tanto que cheguei a alugar uma casa estendendo em muito a minha permanência.
Resolvi escrever sobre isso porque há pouco tempo estive lá
e encontrei com Marciano, neto de dona Marica, a quem eu dei uma bola quando ele era ainda criança e com quem sempre brincava. Quando me reconheceu, fez questão de me
abraçar e chorando disse que estava muito feliz com o reencontro.
A vida me ensinou no decorrer das minhas já quase 7 décadas de existência que aquela
experiência na juventude ao conhecer Galdinópolis, foi o início da descoberta da
minha essência telúrica.